sábado, 29 de novembro de 2008

Carta Aberta

Tempo.
Ultimamente tenho muito pouco tempo livre. Trabalho imenso porque tenho a sorte de trabalhar para o que estudei e de gostar do que faço. Quando não trabalho também acabo por estar ocupado, a divertir-me.
Mas de vez em quando sobra-me algum tempo morto, como o de hoje. É aí que dou por mim a pensar em tudo o que não devia.
Como é óbvio, a tua partida deixou um grande vazio em mim. Vazio que começo a conseguir preencher. Não da mesma forma, obviamente, mas também não quereria que assim fosse. Nos momentos em que tenho este tempo livre é que descubro que ainda não tenho a minha vida arrumada. Ou seja, hoje tenho um sem fim de possibilidades pela frente. Posso ir ter com quem me apetecer, aceitar este ou aquele convite, fazer o que me der na real gana. Mas é precisamente a possibilidade de escolha que me atormenta.
Sou um ser de hábitos, sabe-lo bem. Ultimamente estava habituado a não ter de escolher. Se havia tempo livre, era para passá-lo contigo. Não me estou a queixar. Adorava que assim fosse, nunca o dava por mal empregue. Talvez tenha sido isso o que mais me surpreendeu na nossa relação. Nunca me fartei da mesma, nunca questionei o porquê de estar sempre contigo, nunca pus nada à frente de nós.
Sentia-me bem assim, feliz, completo. Começo a chegar à conclusão que amei alguém a sério pela primeira vez. Achava que já tinha amado pessoas antes, mas pelos vistos não. Ou pelo menos de forma tão intensa.
Em ano e meio, senti apenas uma tentação. Uma da qual não fazes a mínima ideia, não desconfias. Foi efémera, durou uma noite, o tempo em que conheci a pessoa. Estive sempre contigo nessa noite. Nunca se passou nada, foi apenas encanto meu. Sempre me conheceste a comentar contigo todas as mulheres que achei interessantes. Esta não comentei porque tive medo que se percebesse algum entusiasmo fora do comum. Mas é como te digo, dois dias depois já nem me lembrava do assunto, foi algo totalmente efémero. Todas as outras pessoas de quem possas ter sentido ciúmes não significaram nada para mim. Nenhuma delas, nem sequer me senti instado a pensar "what if?".
Tinha uma segurança total no que queria e no que tinha alcançado contigo. Parecia-me impossível voltar a ter o mesmo com alguém, tanta empatia, cumplicidade, gosto pela conversa e interesses em comum. Era fantástico como quando tínhamos de fazer tempo para alguma coisa bastava continuarmos a conversar. De repente já tinham passado três, quatro, cinco horas. Alguns descreverão isso como amizade e dir-me-ão que o confundi com amor. Discordo. Nunca fomos amigos, ao fim de um mês de nos conhecermos já éramos namorados.
Foi no namoro que construímos a relação e que nos descobrimos mutuamente. Foi uma agradável surpresa, registar que todos os instintos que tinha em relação a ti estavam certos. Desde o início que tive a certeza absoluta que eras tu quem queria como companheira e amante. Nunca o lamentei ou mudei de ideias. A amizade que criámos foi resultado de um entendimento perfeito em todos os campos. Daí a perfeição.
Julgo que a grande diferença entre nós residia (e reside) no passado de ambos.
Eu tive uma adolescência rica em experiências, boas e más. Viajei, saí à noite, bebi, experimentei algumas drogas, andei com as pessoas erradas, cometi muitos erros. Tive a sorte de conseguir manter a cabeça no lugar e nunca me deixar levar, de perseguir sempre os meus objectivos.
Tu tiveste uma adolescência protegida, na qual também te deste com as pessoas erradas e cometeste alguns erros, mas não fizeste tudo o que deverias ter feito. Viveste uma adolescência presa numa cela dourada que por acaso é Cascais.
Agora, com a idade que temos, os objectivos são naturalmente diferentes. Eu acabei a faculdade, consegui emprego. Quero atingir alguma estabilidade e gozar o que consegui. Sair e divertir-me, mas de forma diferente. Gastar algum do dinheiro que ganho, passear, etc.
Já tu, entraste na faculdade fragilizada e atormentada (por outros) por saíres da tua terra. Com um ego baixíssimo e com problemas por resolver. Com o tempo e com alguma ajuda, aprendeste a valorizar-te, a perceber que mereces ser bem tratada, a confiar em ti própria e a voltar a confiar nos outros. Agora apetece-te voar, viver, errar. Queres experiências diferentes, viver a chamada vida universitária, cometer os erros de outrora mas aplicados à realidade actual. Sabias que eu o reprovaria e isso era um obstáculo. Comecei a ser encarado como o chato, aborrecido, armado em pai. Isso deixou de ser divertido, deixei de ser objecto de paixão e amor. Daí a ter ficado insuportável, foi uma questão de (pouco) tempo.
Compreendo tudo isto. Não acho justo, mas compreendo. Na minha opinião, se fosses mais madura, poderias ter ultrapassado isto de outra forma. Isto se me amavas da forma como alegavas senti-lo. Sabes que te ajudaria e que se tivesses aberto uma janela de diálogo logo de início, provavelmente terias tido todo o espaço que quisesses. Nunca fui extremista e sempre defendi que é a conversar que os humanos se entendem. Julgo que seria possível continuar este sonho. Não quiseste, puseste-te em primeiro lugar e relegaste o "nós" para segundo. Mais uma vez, é compreensível. Sempre te disse para pensares primeiro em ti, para deixares de viver para os outros. Pelos vistos fui o primeiro a pagar a factura disso. Acho extremamente injusto, mas é o que ganhei.
Desejo sinceramente que enfrentes toda esta fase que procuras da melhor forma. Que não te magoes demasiado (porque ambos sabemos que te vais magoar) e que acabe por te fazer bem, por te fazer crescer e não para te deixar com problemas com o mundo.
Posto isto, espero que sejas feliz e que não te percas nos teus objectivos. E que se te perderes, arranjes maneira de alcançar outros entretanto por ti definidos. Mas sempre feliz. A simples ideia de te saber mal perturba-me o pensamento. Por muito condescendente ou protector que te volte a soar. Mereces apenas a felicidade, realização e alguém bom a teu lado.
Eu farei o mesmo. Conheces-me, sabes que alcançarei sempre os meus objectivos, que lutarei até chegar onde quero. Sabes que serei sempre uma pessoa feliz e alegre, que gosta de viver a vida, viajar e divertir-se. Por muito que agora sofra, já me estou a levantar e a seguir em frente.
Antes diria que nada nem ninguém merece o meu sofrimento ou que deixe de ser feliz por sua causa. Hoje digo que se havia alguém por quem sofrer, eras tu. Era contigo que ambicionava essa felicidade. Como não deixas, procurá-la-ei sozinho. Tu sabes o que valho. Se um dia precisares, sabes que aqui estou para te ajudar ou simplesmente para conversar.
Até lá, boa vida *


P.S.: Se algum dia encontrares estas linhas, provavelmente sentir-te-ás indignada por escrever tão intimamente sobre nós num espaço público. Tentei não revelar pormenores indiscretos e manter a coisa o mais geral possível.
Espero que entendas que me faz bem escrever assim, que me é terapêutico. E que gosto de o fazer para outros. Pelo menos poupo num psicólogo. Espero que compreendas.

1 comentário:

Eleanor Rigby disse...

Infelizmente acabei de ler isto com lagrimas nós olhos... revejo-me demais...