segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Moody

Começo estas linhas às três e vinte e quatro da manhã.
Estou sentado na cama, munido do portátil. E de um copo de vinho do Porto.
À minha frente jaz toda uma segunda temporada de Californication. Até sair uma terceira, não saberei mais do Hank Moody.
Identifico-me demasiado com esta personagem. Não num modo quando-for-grande-também-quero-ser-assim ou também-quero-ter-imensa-pinta-e-sacar-tipas-a-torto-e-a-direito-enquanto-faço-piadas-e-escrevo-livros. É mais num modo se-não-tiver-cuidado-também-acabo-assim.
A minha adolescência e pós-adolescência consistiu em encarnar um pequeno Hank Moody, com bem menos pinta e bem mais borbulhas na cara. Apesar de ser boa pessoa e nunca ter arranjado problemas a ninguém, a minha vida era relativamente caótica.
Existia uma total ausência de planos e a minha ambição máxima passava por fazer apenas o que me desse prazer. O meu ego era do tamanho de um pequeno paquiderme asiático. Juntando a isto um fascínio total pelo sexo feminino e algum jeito para a conversa herdado do meu progenitor, as coisas assumiam um ritmo incerto e absurdo. Apesar disso, sempre fui sociável, cortês e cavalheiro o suficiente para manter amizade com quase todas as pessoas que de alguma forma entraram na minha vida. As outras foram afastadas pela minha arrogância.
Com o passar do tempo fui evoluíndo e modificando ambições e determinações. Passei a saber o que queria e sempre lutei para lá chegar. Continuava a ser o mesmo tipo, mas agora muito senhor de mim, extremamente seguro, calmo e determinado a ser bem sucedido.
Existi assim até 2007. Quando conheci alguém que a pouco e pouco me foi mudando.
Modelou-me o ego e tornou-me aprazível aos olhos da maioria das pessoas. Houve quem aplaudisse e quem não tivesse gostado. Tornei-me um ser estável, moderado e com a preocupação única de amar aquela que me modificou. Era feliz.
Depois o conto de fadas acabou.
Apostei que num instantinho voltaria a ser o mesmo, um sacana dum Hank Moody aportuguesado e de nariz feio.
A verdade é que não sei se quero. Não sei se será essa a vida para mim. Não sei até que ponto serei feliz e concretizado dessa forma.
Acho que posso perfeitamente continuar a ser um tipo bom, decente e apaixonado pela vida. E que posso ser feliz ao comprometer-me novamente com alguém, de forma séria e honesta.
A vida prega-nos partidas incríveis. E isso é tudo de bom.
São três e cinquenta e seis da manhã. Dói-me a cabeça. Vou tentar dormir.

3 comentários:

Eleanor Rigby disse...

Tá giro... Um Hank Tucano. O mal foi terem feito o castng ao David D. e n a ti:S

Anónimo disse...

é bom.cresceste...e afinal ainda só tens 22 anos.
sabes que isto assim quando se olha para trás e me lembro de ti com 8 anos,menino info-fact com um livro de insectos debaixo do braço e a suspirar ocasionalmente pela Mafalda e depois adolescente típico, os tempos do liceu,conversas até às tantas,a faculdade e a pancada pela, agora, aeromoça x)... é bom ver-te "homenzinho" com tudo o de bom e de menos bom (digamos assim) que te trouxe até onde estás.
**

Insano disse...

Tudo certo. Menos a parte da Mafalda. Eu era, provavelmente o único da turma que não suspirava pela Mafalda. Aliás, na 4ª classe não suspirava, ainda que ocasionalmente, por ninguém. No 5º ano comecei a suspirar pela Telma, mas aí já não estavas lá.
Adorei a forma como resumiste 14 anos de vida em 8 linhas ;)